MARREQUINHO – O MENINO DE CAMPO
FORMOSO
Memórias de um artista sertanejo
Capítulo XXIX
O Encontro Com o Chefe de Transporte
As viagens que eu fazia como ajudante
do mano estava em desacordo com as normas da firma, que determinava que o
motorista viajasse sozinho. Mas, o chefe de transporte, fazia vista grossa pelo
motivo do Zé Ricardo ser muito estimado e respeitado pelo dono da Empresa. E, à
medida que eu ia conhecendo os colegas de trabalho do meu irmão, descobri que
sentia um grande orgulho por estar fazendo parte, mesmo em caráter provisório,
de uma turma tão profissional, tão unida e tão solidária. Eram companheiros
leais. Bem diferente da turma de violeiros da qual eu fizera parte por tanto
tempo. Acabei me tornando uma atração para aqueles profissionais do volante, já
que muitos deles conheciam músicas minhas gravadas por “Osmano e Manito”, “Creone
e Barreirito”, “Trio da Vitória”, “Sinval e Dalmy”, “Silveira e Silveirinha”
etc. Todos ficaram admirados por eu estar deixando a profissão de Compositor,
para me tornar um caminhoneiro gira mundo. E eu fiquei admirado, por descobrir
que deveria ter feito isso a mais tempo.
Certo dia quando voltávamos de
uma viagem, encontramos uma chusma de caminhões da Empresa, e seus respectivos
motoristas, parados em um posto de gasolina, próximo a Porangatu (GO). É que um
dos ‘’nossos’’ caminhões havia se quebrado. Motor fundido. E quem havia ido
levar o mecânico para prestar socorro para a máquina avariada, foi o próprio
chefe de transporte, responsável pela frota de quase duzentos caminhões, de
propriedade da empresa. Então, conheci o homem que comandava aquela equipe
modelo, de motoristas-entregadores: o Fayola. Era um profissional competente,
mas, um pouco estranho. Meio maluco. Falava alto, gesticulava muito, e, xingava
pra chuchu. Mas, esse era o seu jeito de ser. No fundo, como vim a descobrir,
com o tempo, Fayola era uma excelente pessoa. Fui apresentado a ele, como o
irmão do Zé Ricardo. Ficamos lá, jogando conversa fora até que o motor quebrado
fosse substituído. O caminhão estava pronto para seguir viagem.
Os que estavam vindo embora para
Goiânia, agora em companhia do chefe, em comum acordo resolveram bater pouso
num rancho da beira da estrada, que havia se tornado local de parada de
caminhoneiros de várias empresas, por ter lá, uma comidinha caseira, danada de
boa, e muito espaço para estacionamento, debaixo das árvores frondosas que
sombreavam o agradável recanto que era conhecido como “O Rancho do João Gordo”.
Lá chegando, tomamos um bom banho de água fria num chuveiro improvisado,
daqueles que tem um balde com ducha de torneira, e é suspenso com uma corda que
é presa num gancho fixo na parede e o Fayola (Chefe) sugeriu umas rodadas de
birita, enquanto a janta estava sendo preparada. Meu irmão Zé Ricardo não bebia,
por isso me nomeou seu representante, para beber com o chefe. O homem era bom
bebedor, mas, eu era muito melhor. Estava acostumado a atravessar noites
inteiras engolindo cachaça, e, não era difícil, para mim, consumir uma garrafa
de “maldita” num pequeno espaço de tempo. Herança dos tempos em que fui
‘’artista’’ e irresponsável. Na conversação que entabulamos descobrimos que
tínhamos duas coisas em comum: beber pinga e pescar de anzol. Enquanto os
outros colegas, mais inteligentes e mais precavidos, preferiram a janta do João
Gordo, eu e meu novo ‘’amigo’’ o chefe, nos distraíamos com a cana engarrafada
e quase acabamos com o estoque da ‘’marvada’’, no pequeno restaurante de beira
de estrada.
A duzentos metros dali, corria o
pequeno rio (decerto ainda corre), ”Cana Brava”, que era chamado de depósito de
piau. Ficou decidido que na manhã seguinte daríamos uma pescadinha antes de
voltarmos pra casa. O homem disse que queria ver se eu era bom pescador o
quanto era bom bebedor. Os colegas formaram torcidas: pró Marrequinho e pró
Fayola.
Pra pescar, ele era bem melhor
que eu, reconheço. E daquele casual encontro, nasceu uma boa e duradoura
amizade. O homem era o chefe, ora.
“MARREQUINHO – O MENINO DE CAMPO FORMOSO”.
Memórias de um artista sertanejo.
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